Querer ir a um lugar pode ser um sonho, mas pode muito bem se transformar
numa realidade.
Depois de tanto tempo organizando, finalmente zarpamos para Athenas no
dia 25 de julho de 2008.
Havia muita expectativa com as novidades que iríamos encontrar pelo caminho,
além da previsão de vento e mar, das condições meteorológicas e geográficas
dos mares por onde iríamos navegar.
Ao sairmos do Mar Iônico deixaríamos para
trás um mar, ancoragens, vilas, ilhas, um mundo que já conhecíamos muito bem.
Dormimos a última noite no Iônico, em Kioni, Ilha de Ithaka, e de lá
seguimos para a ilha de Trizônia à umas 87 milhas no golfo de Korinthos (Kolpos Korinthiakos);
até ai tudo bem, só havia uma variável: uma ponte enorme que puseram no mar ligando o Peloponeso ao continente,
entre o golfo de PAtras (Kolpos Patraikos) e o de Korinthos, nos municipios
de Rhion e Anti-Rhion.
A ponte, que no nosso guia do ano 2006 dizia que estava em construção, tem o
comprimento de 2.290m e a altura útil de 45m, coisa que somente quando se
esta num veleiro com mastro bem alto que se preocupa com esses detalhes, em
todo caso para passar pela ponte deve-se chamar pelo VHF, no canal 14, quando
estiver a 5 milhas da ponte e depois repetir a chamada quando estiver a 2
milhas, para pedir permissão de passagem, dando as informações técnicas do
barco, como calado, altura total da embarcação, velocidade, e assim eles te
autorizarem a passar pelo vão central. Muito simples não?!? Não, primeiro
porque vc esta na Grécia e provavelmente não fala grego e segundo mesmo que
vc fale inglês muito bem, o que não era o meu caso, entender o que os gregos
falam no radio em inglês é complicado. E somado a tudo isso um armator(dono
de barco) que além de não entender nada nem de inglês nem de grego não
acredita na informação do guia, nem do operador do radio e acha que não tem
altura suficiente para passar o barco, você ta achando que é drama?!?
Encontrei ja em Atenas um amigo, skypper de um veleiro de 38m que teve que
voltar para trás porque o operador disse que eles poderiam passar porque a
ponte tinha na realidade 49,5m assim ele mandou o imediato para o alto do
mastro que gritava pra dar marcha ré que o mastro era mais alto 50cm que o
ponto mais alto do vão maior.
Bom conseguimos passar pela ponte com alguma folga e sem precisar subir no
mastro, temos ao todo uma altura de 38m. E logo depois da ponte pegamos vento
de proa de 15 nós com rajadas de 20 a 23 nós, após 1:30h jogamos ancora no
muito abrigado porto de Trizônia e amarramos a popa no pier de cimento.
Ficamos somente uma noite lá porque ainda tínhamos pela frente umas 80
milhas e o canal de Korinthos até nosso próximo porto Korfos no Peloponeso.
O Golfo de Korinthos é longo, estreito e profundo, cercado de
montanhas altíssimas; digo isso pois foi assim que descobrimos que o vento
descia as montanhas com força, e soprava coisa de 28 a 30 nós, o mar não
formava ondas altas, mas baixas e constantes. Saímos às 7h30 da manhã para
fazermos 64 milhas até o canal de Korinthos e depois mais umas 14
milhas até Korfos, assim que saímos do abrigo das ilhas, pegamos um vento E
de 25 nós, ondas curtas e constante, estava muito desconfortável , então por
2h mudamos o rumo, para que as ondas não fizesse o barco bater muito, com
isso perdíamos 2 nós na velocidade, e aumentamos nossas milhas um pouco.
Depois de 2 horas o vento virou para NNE, (nosso rumo) Michele me pediu um
abrigo no continente, quando faltavam 10 milhas para chegar no abrigo, o
vento virou para NWW, enfraqueceu para 17 a 20 nós, resolvemos seguir, ficou
mais confortável e seguimos para o canal, uma hora depois o vento
aumentou muito, ficava na casa dos 32 nós e mudou para NNE e foi subindo...
quando faltavam 4 milhas para a entrada do canal o vento se aprimorou e
ssssoprou de verdade, 38 nós e nas rajadas 41nós, isso quando eu olhava, não
sei se chegou a soprar mais forte, como temos marcação do vento real e
aparente, eu estou falando sempre em vento verdadeiro o aparente acrescente
ai mais os 9 nós que o barco fazia. Parecia um caldeirão, essa troca de
posição de vento, e quando passávamos pelas altas montanhas ele vinha com
força.
Quando finalmente consegui falar pelo radio com a torre de comando, já
estávamos bem perto, avisei que meu inglês é ruim e dei as informações sobre
o barco, depois pedi permissão pra passar.
Eles pediram para eu aguardar 14 minutos, isso era 13h15, passados 15
minutos vimos que a ponte continuava fechada para nós e a bandeira
vermelha, e o vento soprando forte, porque são muitas montanhas altas dos
dois lados do canal, com o motor mantínhamos o barco aproado para o vento, e
como o espaço para essas manobras não era muito grande íamos de um lado para
o outro de popa-proa.
Enquanto nos preparávamos pra viajar para Atenas, estudei todos os guias,
cartas e até pela internet informações sobre os lugares iríamos, sobre o
canal, inclusive pelo site oficial
www.corinthcanal.com
Li nos guias que para pagar a passagem pelo canal vc pode pedir com
antecedência de horas e vai um barco de apoio para receber no seu próprio
barco, ou quando navio já deixa agendado a passagem e o pagamento, ou ainda
se estiver no sentido W/E pode pagar na saída em Isthmía; esse último era no
nosso caso.
Bom com todo stress a bordo,(que não vou dar detalhes, só conto
pessoalmente) chamo de novo no VHF o controle do canal e pergunto se vai
demorar, porque tem muito vento e nós estávamos com dificuldade de manobra,
então ele me falou que eu podia entrar no porto e esperar, perguntei em que
porto, porque muito perto menos de 2 milhas) tem o porto de Korinthos
(cidade) e que não é nada abrigado, avisei que éramos um barco grande de 24m,
poderíamos atrapalhar as manobras dos navios, ele respondeu que podíamos
então entrar e jogar ancora, adverti sobre nosso calado, já tinha visto na
carta que tinha um outro porto antigo do lado do porto grande das naves ,
mas que a profundidade máximo era 3m, nós com 4,50m de calado
tínhamos um problema que com aquele vento não podíamos levantar a bolina,
sem desequilibrar o barco, adernando nas rajadas mais ainda.
O infeliz insistiu para que entrássemos, passado o tempo perguntei de novo
se eram 14 minutos ou 2 horas da tarde, ele respondeu que eram minutos.
Eu não acreditava que era pra entrar no porto do canal, mas ele insistiu e
nós entramos, ficamos abrigados das ondas mas não do vento, nessa hora ele
me chama no radio e avisa que tem um barco de manutenção pedindo pra entrar
no porto e ai fomos obrigados a sair de novo, nos moles não dava para
atracar porque a profundidade é de 2m a 3m e a maré corre muito no canal e
tem uma amplitude maior que no resto do golfo.
A essa altura dos acontecimentos o barco já esta totalmente salgado, eu já
tinha levado uma 4 ondas. E num 'mea culpa' pedi pra o operador do VHF falar
pausadamente pra poder entender o que ele falava. Quando era
13h35 ele me chamou e avisou que tínhamos que esperar mais 20 minutos, havia
uma prioridade de passagem, em Isthmía, era um enorme navio sendo rebocado.
Esperamos, e finalmente a ponte que passam os carros afundou e o barco
de manutenção saiu do porto e o controle do canal nos chamou liberando nossa
passagem depois que o navio e um veleiro que vinha atrás saíssem do porto.
Entramos no canal!! Foi uma festa! Todas as câmeras fotográficas
apareceram, estávamos abrigados do vento e num mar azullllll, tudo calma
e paz. Tirei um monte de fotos. Foi muito legal! Emocionante! Em cima das
pontes altas de 55 m, ficavam pessoas fotografando a gente lá embaixo, é
impressionante, como é estreito o canal, tem 24m de largura, funciona em mão
única, tem pouco mais de 3 milhas de comprimento.
Teve ainda um episodio bizarro, um maluco que pulou de cima de
umas das pontes, com cordas elásticas presas no pé (Bungee jump)!!
Exatamente no instante que o Fetch IV terminou de passar por ele, parecia
que ele ia tocar a popa do barco, só que tocou a água
com as mãos, vejas as fotos do maluco.
Ao sair do canal tem um pier grande de cimento e depois uma pequena baia
para os barcos que entram ou saiam do canal ancorar ou tento espaço ficar no
pier de cimento e ir pagar as taxas.
Fiz o calculo na internet no site oficial e obtive o valor de 652,95 euros
para o Fetch IV, tinha feito inclusive a reserva com o horário
previsto da nossa chegada, eles me responderam por email 15 minutos antes da
gente passar pelo canal, mas como tudo era um caos naquela hora é lógico que
só recebi o mail muito mais tarde.
E lá fui eu, meu miserável inglês e Michele pagar a tarifa, chegando no
escritório das autoridades fomos muito bem recebidos, eles são muito
educados, gentis, embora falem somente inglês, se podia entender o que
falavam.
Avisaram que quando quisermos voltar é só chegar e falar com eles, o
canal é aberto de acordo com a demanda. Por fim uma boa notícia, não sei
porque mas me perguntou a bandeira do barco, depois naturalmente, o
tamanho, calado e boca do barco, não pegou a tonelagem pois é da categoria
Sailing private , não sei se foi esse item ou porque é da comunidade
européia, mas a tarifa ficou mais barato e pagamos 451 euros.
Resumindo: foram 200 euros de economia e 131 milhas a menos do que dar a
volta no Peloponeso para fazer de Bari a Atenas.
De Isthmía seguimos para Korfos, 14 milhas depois uma baia muito abrigada e
grande,aqui fiz meu primeiro banho de mar no Egeu.
Amanhã ainda tem esse bendito NE de 30 nós soprando o dia todo, até dia
05/08. Vamos acordar cedo, temos ainda 24 milhas até Atenas com vento na
cara.
Assim eu estou aqui no Egeu, com banho de mar, a benção de Poseidon e o pior
vento que tem aqui: O mítico Meltemi.
Pra quem gosta de ouvir histórias vou deixar alguns detalhes da chegada e
manobra à Zea Marina em Atenas e outras curiosidades para ter o que contar
pessoalmente.
Sobre Atenas é uma das cidades mais bonitas que conheci, tudo muito
organizado, limpo, claro e nada de arranha-céu,(aqui tem terremoto sempre).
Atenas é maravilhosa, com muitas arvores, as pessoas te recebem bem,
um povo bonito e além do que a cidade transpira
história e mitologia; tem muitos barcos e marinas, e tem vento o dia todo pra quem gosta de
velejar. Adorei Atenas!! Que Já esta na listas das cidades que gostaria
de morar.
Se você acha que acabou .. tem mais, só contei como foi chegar à Atenas, ainda
tem as ilhas saronicas onde passamos 3 semanas velejando.
Tem mais fotos no álbum de retratos:
Coisas que vi
Iasas e bons ventos
Christina Amaral
Mar Egeu, 31 julho de 2008.