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Luthier – Balanço

 

Clique aqui para conhecer a história do veleiro Luthier e sua tripulação

 

 

Versão da Catarina

Povo que ora me lê: é com a dignidade da pessoa humana, a igualdade de direitos de todos, a participação nos problemas da comunidade, a mobilização da sociedade e, ainda, com a devida co-responsabilidade, que ora vos falo, no intento de apresentar um apanhado da nossa experiência a bordo, nesse nosso último cruzeiro ao nordeste. Tudo isso inspirada nos conceitos da Cartilha de Trânsito, lançada pelo governo, que precisei assimilar para realização da prova de renovação de minha carteira de habilitação de motorista terrestre. Apresentarei só conceitos úteis, como se pode antever…
Antes de tudo, estamos de volta de nossa ida a São Paulo. Fomos para lá, de carro alugado, com o Dorival na direção, pois minha carteira estava vencida. Ele dirigiu, inicialmente, a assustadores 70 km por hora, e eu ainda pedi para que a velocidade fosse reduzida, mesmo com uma fila de carros atrás de nós, querendo nos ultrapassar. Efeito do 1 ano e pouco longe da estrada, andando à média de 10 km por hora.
Depois de tanto tempo vivendo apenas no litoral, nossos olhos foram os primeiros a reclamar da mudança de ambiente: ficavam irritados e vermelhos. A rotina também mudou, de planejamento de viagem e ancoragem, para salas de espera de consultórios, controle de bagagens, de burocracias, e do trânsito. Não fosse a compensação de rever parentes e amigos, diria que foi uma viagem plena de obrigações, e de camas estranhas, que não balançavam, nem um pouquinho. A sensação de deslocamento foi se amenizando com a proximidade da data de retorno.
O Dorival voltou dirigindo o tempo todo, porque só tinha espaço na agenda de provas do Departamento de Trânsito para a semana seguinte, e eu não ia ficar esperando por isso, não ia, não. Também, não sei se passaria na prova, porque ainda não entendi o que a dignidade humana tem que ver com a direção defensiva, ou as leis de trânsito.
“Aí, olha só, continuamos no Bracuhy, no Rio de Janeiro, “tá ligado?” Aqui sempre rola um pagode, do tipo “meu amOOOr”, ou um “funck”, na boca da moçada. Falam “biSSScoito”, com o “s” longo, muito engraçado. Eu também falo “PORta”, de vez em quando, e alguns riem de mim, então, está tudo certo. Também é a terra do calor, e de uma boa feijoada!
No momento, o Luthier foi invadido por uma serra tico-tico, como uma máquina colheitadeira desembestada, fazendo pó para todo lado. Nota “5”, de 1 a 10, para o planejamento do pó, feito pelo Dorival; realmente, ele é melhor em navegação. Se ele tivesse me avisado, eu teria coberto tudo com lençóis. Tudo bem, o pó é para melhorias no barco, e o agente poluidor estava com “foco” no serviço, há que se compreender.
Voltando ao tema, eu sei que, se auto-ajuda ou conselhos fossem bons, livros sobre esses assuntos não estariam sempre em oferta nas livrarias, mas vou falar sobre posturas que achei importante para cruzeirar; quem sabe, sirvam para você.
E assim, vamos à primeira: NÃO RECLAMAR! De nada! Nem do tempo que virou, nem do vento de cara, nem do equipamento que resolveu não funcionar, nem do lugar aonde você chegou, das coisas que não foram encontradas no supermercado, nem das pessoas que cruzaram seu caminho. Afinal, as coisas são o que são. Para isso, o melhor é não alimentar expectativas, sobre nada, nem ninguém: vive-se mais feliz assim!
Outro: FICAR TRANQUILO(A)! Cheque todo o equipamento, os víveres a bordo, a previsão de tempo, faça um bom planejamento da viagem e, depois, é só aproveitar a imensidão do mar, para pensar no infinito, nas coisas boas, tudo antes do primeiro enjôo. Quanto mais tranqüilo, mais longe se vai!
Quanto às maneiras de se viver a bordo, acho que mudam de pessoa para pessoa, de família para família, cada qual com seus próprios costumes e manias, como em uma casa. E é bom que as pessoas sejam diferentes, senão, que motivo teremos para rir? Explico: assim como em uma casa, há pessoas que amam alguns eletrodomésticos, como a máquina de lavar louça, e outras que a acham completamente desnecessária. Algumas gostam de se vestir de preto, ou de cores escuras, para não encardir com a lama da âncora, ou de cabos de poita, e aparecer menos a sujeira, e outras preferem uma cor clara, mesmo que encardida, por ser mais fresquinha, como é o meu caso. Na boa, diferenças existem, e devem ser respeitadas, senão, nos tornamos pessoas intolerantes, e duras, como aquele vizinho que implica porque o outro ainda não varreu as folhas da calçada, com a vizinha namoradeira, ou com a bola das crianças na rua.
Nem eu mais estou me agüentando… “Aí”, desculpe a filosofia barata! Da próxima vez, vou tentar falar sobre assuntos práticos, do tipo: como a dignidade humana pode estar relacionada com a fermentação de massas de pão, doces ou salgados. Vamos ter tempo, enquanto fazemos as melhorias e reparos necessários no barco, além de resolver algumas pendências de terra. Agüentem-me, até lá!

 

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Versão do Dorival

Um ano viajando, desde Angra até Fernando de Noronha, ida e volta, não é suficiente para dizer que sou especialista em alguma coisa, mas dá para fazer um balanço bem interessante.
Durante a viagem, anotamos muita coisa em uma agenda, e no livro de bordo. Vou organizar essas informações por assunto: o que deu certo, o que deu errado, navegação, meteorologia, manutenção, custo, marinas e ancoragens, etc…, e publicar para comentários, críticas e sugestões.
Provavelmente, o custo da viagem é o que mais demanda interesse, mas preciso de algum tempo para organizar esse item e, por isso, vou começar com o que deu errado.
O item que não deu certo que mais me incomodou já está resolvido: a privada. A privada do Luthier, de uma marca americana famosa, era do tipo manual. Esse tipo de privada funciona bem para quem usa o barco de fins de semana e temporadas de férias. O uso diário demanda muita manutenção. Depois de 3 meses, já tínhamos problemas com a vedação do êmbolo, o retentor já tinha perdido a pressão da mola, e os anéis de vedação (o-rings) do êmbolo estavam inchados, fazendo o bombeio ficar muito difícil; por sugestão, começamos a colocar óleo na privada. Logo os “o-rings” ficaram frouxos e a bomba perdeu eficiência. Depois de instalar o kit de reparo do fabricante, após dois meses tudo estava ruim outra vez. Procurei “o-rings” de borracha nitrílica, e retentores que tenham a mola encapsulada, para evitar a corrosão. O retentor funcionou, mas os “o-rings” ficaram frouxos, sem prenderem primeiro. Desisti, comprei um “kit” de conversão elétrico. Esse kit é barulhento mas, até agora, não tivemos mais problemas de manutenção.
Outra coisa foi o filtro de óleo diesel do motor. Uso dois filtros, um de 30 mícrons externo, e um de 10 mícrons, montado no motor, original da Yanmar. Esse filtro de 10 mícrons é muito pequeno e caro, entope com muita freqüência. Substitui a montagem e o filtro por um Delphi padrão. O elemento filtrante tem muitos fabricantes, pode ser encontrado em qualquer lugar, e custa oito reais.
Tenho que admitir que o comandante do Yahgan me avisou, logo que conheceu o Luthier, que esses dois ítens eu ia ter que mudar. Não foi só isso, não, nada como 17 anos de mar.
O filtro de entrada de água salgada de refrigeração do motor também foi mudado de posição, para ficar abaixo da linha d’água. Na posição original, dependendo da condição do mar, entrava ar no filtro, dificultando o funcionamento da bomba, danificando o rotor.
Ventilação é um problema que ainda estamos resolvendo. O Luthier tem muitas vigias e gaiutas, o que o deixa bem fresco e confortável quando estamos ancorados e filados ao vento. Mas, em marinas e viajando no mar, o barco fica muito quente. Um aparelho de ar condicionado, já providenciado e instalado (ufa!), resolve, ou espero que resolva, quando estamos em marinas. A ventilação durante a viagem eu ainda estou estudando como fazer. Por hora, comprei e ainda não instalei dois exaustores. Estou estudando a colocação de “dorades”. Qual modelo e onde instalar? Aceito sugestões.
O coletor de água da chuva que eu montei, a calha, funcionou bem, mas é chato de montar, guardar, ou seja, muito complicado. Os toldos de cobertura não têm um formato bom para coleta de água. Se você pretende viajar, lembre-se de que vai ter que coletar água da chuva. Esse é mais um ítem da minha lista de tarefas.
Precisa de comando do carrinho da genoa no cockpit, em um veleiro de cruzeiro? Sim, eu acho indispensável. Também não dei atenção a isso. Achava que quando precisasse era só levantar o pino e mudar o carrinho para frente ou para trás. É verdade, se você está em uma área abrigada, passeando em uma tarde de sol, com tripulação disponível. Viajando, especialmente no verão, descendo a costa, os ventos são fracos e variáveis. A velocidade do vento varia de 8 a 15 nós, quatro a cinco vezes por dia. Ventos assim demandam um freqüente ajuste da torção da genoa. O impacto desse ajuste no Luthier é impressionante, a velocidade aumenta meio nó, fácil. Quando a torção da genoa está bem ajustada, o barco aderna menos, fica equilibrado, demandando menos do piloto automático. Meio nó de velocidade, em uma viagem de 50 horas, são 25 milhas. Ajustar o carrinho quatro ou cinco vezes ao dia, durante uma passagem, não parece um problema. Por segurança, só vou fazer ajustes que demandam sair do cockpit com a Catarina vigiando. Além disso, preciso que ela folgue a escota para eu conseguir mover o carrinho, e ajustar a escota novamente para observar as birutas, e verificar se o carrinho ficou em uma boa posição, e assim vai… Gostamos muito de velejar, ajustar velas é uma delícia de fazer, mas tirar o companheiro do sono, durante o turno, para ajustar vela, é uma sacanagem. Por isso, pretendo colocar algum tipo de comando remoto da posição do carrinho, para poder fazer essa operação sem precisar ir ao bordo de sotavento. À noite, com a mestra rizada, esse ajuste é ainda mais importante.
Com muito vento, rizamos a genoa, o que também demanda ajuste do carrinho, para que ela fique com uma boa forma e o barco fique mais estável.
O esgotamento do porão do banheiro é outro problema. Já sei que tipo de bomba devo usar. As bombas de porão estragam rápidamente, especialmente com os cabelos finos da Catarina. Além disso, elas não conseguem esgotar totalmente o porão, o que demanda muito tempo depois do banho para secar tudo. Fazer isso, todo dia, é chato! Vou mudar o tipo da saída, e trocar a bomba. Essa tarefa é uma modificação grande, envolve resina, fibra, pintura, etc. Continua depois…

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